6.4.17

Project#6 | Isa Guitana Wong ✩ Professora de Ashtanga Yoga

Tem um sorriso transbordante e um olhar luminoso que irradia paz interior. A voz, de timbre forte e seco, invoca os ventos quentes do deserto. 
Conheci-a num dia em que o trabalho de ambas se cruzou e fiquei com a certeza de que seria uma das Mulheres que gostaria de trazer até este projeto.

Depois de um longo interregno e de muitas tentativas frustradas para conciliar agendas, o Project#6 regressa, ao fim de 8 longos meses de ausência. 

Escolhemos para esta conversa a companhia das dunas do Guincho, num fim de tarde que prometia um pôr do sol épico, que acabou por não acontecer. Tudo o resto foi perfeito. A energia que esta convidada emana só podia fazer com que tudo resultasse dessa forma.

Isa Guitana Wong, é a Senhora que se segue.





Isa, quando é que descobriste este amor e esta devoção ao Yoga?

Quando comecei a ser exposta ao Yoga, não estava muito interessada e recetiva, creio que ainda não tinha chegado o meu momento. Foi só quando senti pela primeira vez o Ashtanga Yoga em particular, aí sim foi amor à primeira prática. Toda a experiência senti-a como muito profunda, tudo aquilo que tinha acabado de fazer trouxe-me uma integração de todas as partes de mim, tudo fez sentido. Senti logo na primeira prática uma transformação de perspetiva na forma de sentir e observar o meu mundo interno, senti uma tomada de consciência em como aceder às diferentes camadas do meu ser e de como tudo se encaixa, embora que a um nível subliminar foi muito evidente.
Senti que este era sem dúvida um caminho a continuar. 

A devoção ao Yoga, começou a tomar expressão quando a prática me começou a fazer render a algo maior que me transcende. Quando passando a tomar maior consciência dos meus defeitos e das minhas qualidades, me ajuda a comprometer a gostar de mim tal e qual como sou, quando me mostra como cuidar de mim com um respeito profundo de que todas as minhas escolhas caminhem em direção à luz, quando me ensina a ser guardiã da minha mente e a estar presente e atenta ao que sucede depois do surgir de um pensamento, depois de verbalizar uma palavra no meu diálogo interno e com o outro, depois de um comportamento comigo e com quem me rodeia... e este referencial que a prática continuamente me dá, ajuda-me a conseguir melhorar os meus hábitos e a elevar os meus valores. Esta prática sem dúvida traz mais luz e sentido ao propósito da nossa Vida, delineando o nosso Destino honrando quem realmente somos, tornando-nos mais autênticos e verdadeiros connosco e com o mundo.



Que diferenças essenciais notas na tua vida, no que respeita ao antes e ao depois da tua iniciação na prática?

​A diferença essencial que senti na minha vida foi compreender o verdadeiro sentido do significado de Estar e de Dar. Sentir com o todo o meu ser o que é de facto estar presente incondicionalmente para mim própria e para o outro.
Claro que isso teve um grande impacto quando eu comecei o meu percurso na minha prática pessoal, não só porque eu senti em mim o quanto era aquilo que procurava, conhecer-me a mim própria, aprender a cuidar de mim com toda a minha presença, esta é a verdadeira dádiva, a cada prática proporcionar um encontro comigo em que ao desbravar terreno interno me permita gradualmente ser mais tolerante comigo própria, e a proporcionar mais espaço e tempo para aprender a crescer internamente como Ser.

Outro salto quântico foi quando comecei a ensinar, o assumir dessa responsabilidade que é tão grande, trouxe-me a mais pura das gratificações internas que podemos ter nesta vida... ao ensinar pude sentir de uma forma ainda mais clara o Estar verdadeiramente Presente para o outro, dando-lhe tudo aquilo que tinha ao meu alcance para o ajudar. Este cuidar do outro para que Ele encontre o seu caminho de volta à sua casa interna traduz-se em amor incondicional. 
Eu sou filha única e isso foi mesmo flagrante, estava mais habituada a receber … e esta descoberta mostrou-me a fonte inesgotável da felicidade suprema, o Dar, o Estar para o outro.

Ao longo destes anos ao receber tantos alunos é comovente e muito bonito ver a transformação pela qual todos passam, a partir do momento em que se inicia esta prática, este processo metódico conduz a nossa reflexão interna a trazer-nos uma melhor realização de quem somos em essência, acelera todo um processo de compreensão da nossa consciência interna, catalisa toda uma mudança de estilo de vida e de hábitos. 
Não nos tornamos diferentes daquilo que somos, pelo contrário tornamo-nos mais genuínos, próximos e fiéis àquilo que realmente somos e conseguimos fazer escolhas mais significativas na nossa vida e isto por si só traduz o quão profunda é a prática do Yoga. Chega até nós com milhares de anos de aperfeiçoamento e é sem dúvida uma grande ferramenta à qual podemos recorrer para nos ajudar neste caminho da vida. 



Da tua experiência, sentes que as pessoas procuram com frequência a prática de Yoga para resolver a agitação em que todos vivemos hoje em dia? Ou, de outra forma, achas que as pessoas estão a procurar meios alternativos - que curiosamente são milenares - para melhorar a sua qualidade de vida?

As pessoas procuram o Yoga por um vasto leque de motivos, quando chegam à Casa Vinyasa, alguns vêm para reduzir stress outros ​mais pelo desafio físico, outros simplesmente porque um amigo ou o médico disse que tinha de experimentar, todos os motivos são válidos...

​A agitação dos dias de hoje é essencialmente interna… e claro aparentemente externa, porque tudo se reflete, projeta e introjeta. O acalmar das aflições da agitação interna só é possível quando não fugimos delas, quando olhamos para elas com olhos de ver, quando as ouvimos sem censura e sem julgamento, quando as abraçamos em vez de lutarmos contra elas.

E a prática do Yoga, é isso, é uma tomada de consciência do que todo o nosso Ser seja no plano físico, mental, emocional ou espiritual está a tentar comunicar connosco. Essa comunicação é constante e começa por ser subtil, mas andamos muito distraídos, não prestamos atenção e quando não estamos presentes ela vai-se fazendo ouvir de forma mais evidente e aí manifesta-se através da dor, e quando ignoramos e não fazemos um trabalho de escuta interna instala-se a doença.

O momento da prática do Yoga proporciona momentos de escuta interna ativa, a prática ajuda-nos a olhar para dentro de nós e está constantemente a desafiar a nossa zona de conforto. A prática resume-se a isso, para crescermos internamente em todos os sentidos temos de sair da nossa zona de conforto, e é por isso que é uma prática e não apenas um exercício ... é um treino para a Vida que por sua vez é totalmente imprevisível. Daí ser tão importante uma prática numa base diária, porque se torna numa potente medicina preventiva para a Vida … seja por pouco tempo quinze, trinta minutos ou mesmo uma hora ou duas, apenas essa regularidade e continuidade de prática é determinante para estarmos mais preparados, resilientes e melhorarmos a nossa qualidade de vida.

É como se fosse também um espelho para a alma, que vai ficando cada vez mais nítido... por vezes é difícil olhar para dentro, mas a prática suporta-nos e convida-nos a mergulhar dentro de nós sem medo e a aprender que só ao confiar nesse processo profundo de aprendizagem, é que temos realmente a oportunidade de nos tornarmos gradualmente a melhor versão de nós próprios. 



Diz-me, isto do Yoga não pode ser um ato isolado, pois não? Ou seja, há toda uma forma de estar na vida que é prévia ou se altera em função dele, correto? Por exemplo, ao nível da alimentação, das horas de descanso... Há um Todo, por detrás desta vivência plena, um caminho holístico, não é?

A nossa natureza é inteligente, quando começamos um processo de prática de Yoga que nos limpa, que nos purifica, que nos desintoxica, as primeiras mudanças vão ser ao nível da alimentação ... sem esforço passamos a preferir ingerir alimentos mais saudáveis que nos nutrem não somente a um nível físico, mas acima de tudo a um nível emocional e psicológico ... e o primeiro alimento que nos acalma é a respiração... a relação com a comida passa naturalmente a ser menos ansiosa, porque já carregamos todo o nosso ser com Prana, energia vital durante a prática. Já não caímos tão frequentemente na falência da mente de que estamos com desejos disto ou daquilo (que sabemos que nos faz mal), a respiração já nos nutriu a níveis mais profundos. Como consequência, os ciclos de sono também regularizam porque sintonizamos com os nossos ciclos naturais porque estamos em processo de observação e escuta interna... questionamo-nos constantemente: o que é que todo o meu corpo/ser me está a pedir neste momento? o que é que vai promover neste momento um estado homeostático? ... e muitas vezes é o descanso, um bom relaxamento profundo de 15 a 30 minutos equivale a uma noite de sono porque conseguimos aceder a ondas cerebrais que regeneram todo o nosso cérebro.



O Yoga conduz a um estado de plenitude interior que se pode de certa forma chamar de Paz, não é? O que é preciso para isso: uma grande luta interior - todos animais são de certa forma caracterizados pela pulsão da guerra, da luta, do impulso da conquista - ou, pelo contrário, um estado de "desapego" e "abandono" à nossa essência?

Quando iniciamos a prática do Yoga, é uma grande descoberta que passa por diferentes fases. Creio que o que aconteceu comigo, acontece de diferentes formas com todos os praticantes: quando foi amor à primeira prática simbolizou um encontro profundo comigo mesma o qual proporcionou voltar a apaixonar-me por mim própria … esta cumplicidade interna trouxe momentos de êxtase/paz interna ficando inebriada e invadida por uma felicidade que não se explica por palavras.
Claro que os primeiros meses de prática são assim, tudo é novo e embora muito desafiante, tudo é encantador e nos fascina, é a descoberta de um novo mundo, para lá do que imaginávamos ser possível, damo-nos conta de um potencial mais vasto que reside dentro de nós.

Com o passar do tempo a prática encarrega-se de trazer tudo ao de cima, o melhor e o pior de nós próprios, e aí começa a verdadeira prática. A prática não deixa varrer para debaixo do tapete e deixar escondido aquilo que não gostamos, não nos deixa ignorar uma parte de nós, fingir que não está lá, o espelho é demasiado nítido, não distorce… e claro todo aquele encantamento inicial vai passar por altos e baixos e começam as primeiras tempestades e lutas internas. E são precisamente estas tempestades e lutas que proporcionam um terreno fértil para a mudança.
Nestas fases, sentimentos muito profundos vão ser trabalhados porque entramos em contacto com lados nossos que nos fazem sair da nossa zona de conforto… e com isso aprendemos a desenvolver paciência e compreensão de que nem tudo é tal e qual como gostaríamos que fosse e aprendemos gradualmente a desapegar-nos de querer controlar tudo e todos, porque isso por si só é um obstáculo ao encontro com a nossa essência.



És casada e tens dois filhos. O Yoga também está presente na tua vida familiar? De que forma?

​A vida é cheia de presentes e o maior deles é a família. ​
​E​u sinto que a minha família mais próxima, nomeadamente os meus pais, foram os meus primeiros ​gurus e com quem vivo e convivo numa base diária, o meu marido, os meus filhos são os meus gurus. Com eles aprendo tanto, é constante, o que aprecio verdadeiramente é que com eles que são tão próximos, tudo vem da forma mais pura, crua e autêntica possível e eles realmente me​ desafiam a trabalhar aquilo que há para resolver internamente. 

Na mais pequena troca, nos mais pequenos grandes episódios, por mais desafiantes que sejam temos de desenvolver recursos para não reagir e estar abertos e recetivos a deixarmo-nos inspirar por eles, pela mensagem que eles nos estão a tentar transmitir e inspirá-los de volta com um enorme sentimento de gratidão por eles estarem ali a mostrarem-nos o caminho. 

​A verdadeira prática do Yoga está na vida, o que fazemos na prática é um treino para nos prepararmos a nós próprios para a vida. Tal como a prática nos incita a olhar para dentro, não há nada mais poderoso do que as relações que temos com a nossa família: os padrões que nos damos conta que adotamos transgeracionalmente, o que vemos nos nossos filhos e como isso nos faz constatar os nossos próprios padrões é um referencial constante daquilo que temos de trabalhar internamente. 

Tudo isto traz uma profunda expansão da nossa auto-consciência, do nosso sentimento de conquista pessoal naquilo que realmente é determinante nesta vida e a prática do Yoga dá-nos um método acessível para encarar esses desafios.



Recomendas a prática de Yoga para crianças? A partir de que idade? Em que é que achas que isso as ajuda, no seu crescimento?

Sim, desde cedo, o mais cedo possível, desde que nascem. O Yoga dá recursos e estímulos que ajudam a/o Mãe/Pai e o Bebé a descobrirem-se, a conhecerem-se, a comunicar um com o outro. O estabelecimento desta relação mais basilar na vida é determinante na saúde a todos os níveis. Nas aulas de Yoga a Dois na Casa Vinyasa vejo a bênção que é ter nos primeiros meses tão desafiantes um espaço para respirar a dois, contemplar um ao outro, descansar… é excelente para os dois partilharem esse espaço interno que preza o sensitivo.

Para a criança o Yoga transmitido com uma abordagem lúdica planta sementes que vão ser muito determinantes na sua relação com o imaginário, com o sonho, dar espaço a esse mundo tão importante para a criança para que se encontre dentro de si e que se enraíze na vida real de uma forma mais mágica.

Mais tarde na transição para a adolescência, nessa fase de grandes mudanças, ajuda consideravelmente a encontrar uma relação mais harmoniosa com o seu universo interno e como se expressar confortavelmente sem perder a sua idiossincrasia de acordo com as diferentes solicitações que a vida começa a trazer nesta transição e ponte para o estado adulto.



Achas que o Yoga devia ser parte dos programas curriculares, a par da Educação física, nas escolas?

Absolutamente, acredito que isso se manifeste mais tarde ou mais cedo a um nível global. Não somente a par da Educação Física mas também como uma disciplina mais filosófica e de reflexão interna. O Yoga envolve o movimento do corpo mas assenta acima de tudo no movimento da Consciência, o aprender a Estar Presente onde é mais necessário a cada momento para deixar que essa ligação e conexão interna nos guie para fazermos as escolhas mais sábias e sabermos navegar na vida com equanimidade. Essa é a melhor contribuição que podia ser feita ao nível do sistema educativo.



Fizeste a tua formação, ou parte dela na Índia, não foi? Conta-me tudo sobre isso, sobre essa viagem dos sentidos, à pátria do Yoga.

Ohhhh a Índia, essa terra e esse povo tão únicos com os quais tive o privilégio de aprender tanto em períodos largos, ao longo dos 10 anos que passei lá. Posso dizer que já viajei bastante mas como a Índia não há igual... é único, é de uma riqueza incomparável em termos de estímulos ao nosso espírito. Tenho memórias-tesouro de momentos de infinita beleza na simplicidade de episódios em que me corriam lágrimas de emoção que me fizeram sentir que aquele lugar era o lugar para se estar e me deixar ficar.

A Índia tem sido para mim, mais do que qualquer outro lugar no mundo, um lugar onde vivi importantes mudanças na minha vida. Mencionando as mais importantes, o lugar onde conheci Guruji, Sri K. Pattabhi Jois que me inspirou a dedicar a minha vida à prática e ao ensino do Ashtanga Yoga; o lugar onde vivi sozinha pela primeira vez, o lugar onde concebi o meu primeiro filho, o lugar onde me apaixonei à primeira vista pelo meu marido... Trouxe-me tudo o que se pode querer nesta vida! Um lugar muito especial, que facilita a possibilidade de me desligar do mundo externo e de me dedicar inteiramente, de uma forma intensa e focada a esta prática espiritual, desbravando terreno interno conduzindo-me de volta a "casa", ao âmago do meu ser. Cada viagem tem sido assim muito enriquecedora contribuindo de uma forma decisiva e desafiante quer ao nível pessoal como profissional.

Recordo Guruji com muito carinho, respeito e sempre muita saudade. Guardo dentro de mim a sua presença, a sua voz, o seu toque, o brilho do seu olhar. É quase difícil transmitir em palavras e sem me emocionar a profunda admiração, devoção e fonte de inspiração que sinto por ele. Era impressionante sentir o amor que ele tinha ao transmitir esta prática, a forma como vibrava ao passar de forma tão simples a sua mensagem. Quando o conheci já tinha 86 anos e o seu espírito era como o de uma criança, cheio de vida e o seu sorriso denotava um encanto e uma satisfação únicas. Sinto-me profundamente grata por me ter cruzado com ele nesta vida ... por ter sentido e recebido a firmeza do seu toque com toda a fé, entrega e confiança ...​ ​por ​ter ​ouvido a sua voz bem pertinho durante e depois de cada ajuste quase a sussurrar: breathe one, two, three ... A relembrar-me do mais importante, uma respiração de cada vez​ ​...​ recordo-me ​vividamente​ de todos e em particular do primeiro e último ajuste que me fez. Foi muito bonito poder estudar com ele todos estes anos e continuar a senti-lo tão perto cada vez que ensino, cada vez que reproduzo nos meus alunos tudo aquilo que ele me passou.

Continuei os meus estudos com Sharath, o seu neto, e ele puxa por mim de uma forma muito única e singular. ​D​esde a minha primeira viagem à ​I​ndia em 2002, ​e em todos os anos subsequentes em que passei vários meses por ano em Mysore, ​tive o privilégio de estudar diretamente com Guruji sempre acompanhado do seu neto Sharath. ​D​esde o início, ainda no antigo​ shala​ em Lakshmipuram, Sharath sempre me soube confrontar comigo mesma e tem sem dúvida a capacidade de me tirar da minha zona de conforto​, o que me parece fundamental para que neste solo fértil da prática do Yoga, ocorram as devidas transformações e se colham frutos. Depois do Guruji deixar de ensinar e passar o testemunho ​a Sharath, sinto que embora ele tenha herdado centenas e centenas de alunos para cuidar, ele conhece-me e sabe perfeitamente onde me encontro na minha prática continuando de forma sólida a desafiar os meus limites. Recordo com muito carinho um momento especial em 2010 quando tive de dar parte de uma aula guiada no shala​ (Shri K. Pattabhi Jois Ashtanga Yoga Institute) repleto de alunos em frente ao Sharath como parte da avaliação para o curso dos professores autorizados. Aprendi muito também quando tive a oportunidade de assistir Sharath em 2011. Nestes últimos anos tem sido emocionante e uma honra poder não só praticar mas também ensinar sob a orientação de Sharath no mesmo shala onde Guruji ensinou.



Já tiveste outra atividade profissional? Se não fosses professora desta prática, o que te imaginavas a fazer? 

Estudei psicologia mas nunca cheguei a exercer porque entretanto o Yoga intersectou-se (e ainda bem ...) pelo meu caminho. Claro que nada é por acaso, e um percurso de vida prepara-nos gradualmente para aquilo que mais tarde vai ser necessário. Tudo aquilo que aprendi em psicologia aplico diariamente quando ensino Yoga.
E consigo sentir que todos estes anos a aplicar a minha voz como professora de Yoga ajudaram-me a perder a minha timidez a cantar em público. Adoro cantar, adoro sentir a vibração da minha voz no meu corpo, no meu Ser, adoro acalmar estados de espírito com esta expressão tão libertadora e que nos dá acesso imediato e direto ao Divino.

Adorava ser cantora. E só agora há muito pouco tempo assumi essa parte de mim por inteiro, foi como um renascimento … desde que me conheço que aquilo que mais gosto de fazer na vida é cantar … e se tivesse essa oportunidade gostava de partilhar a minha voz com o Mundo.



Fizeste anos há pouco tempo. És Peixes, o signo da intuição e da sensibilidade. Este ano celebraste o teu dia de aniversário de uma forma muito especial, com a partilha de um sonho realizado. Fala-me um pouco mais dessa tua outra paixão. 

Sim, foi mesmo a realização de um sonho de infância, gravar um videoclip musical e partilhá-lo com a minha família alargada de alunos. Lembro-me que em pequenina passava horas a ouvir música e a ver videoclips, a cantar e a dançar no apartamento mínimo dos meus pais na Lapa, mas que tinha uma sala grande e esse era o meu “palco”! Cantar era algo mais forte, até nas aulas eu estava sempre a cantarolar, ao ponto de um dia, embora sendo o que se considera uma boa aluna, ter ido para a rua numa aula de Economia porque não conseguia parar de cantar. Esse era o meu estado natural.

Com a adolescência, creio que a minha mente me convenceu de que não cantava assim tão bem e deixei progressivamente de cantar. Só retomei mais tarde na Índia. E no meu primeiro dia de aulas de canto com a minha primeira professora, quando comecei a Cantar de novo, não consigo expressar em palavras o que senti, só sei que a emoção tomou conta de mim e chorei um Oceano por voltar a entrar em contacto com a minha essência mais pura, mais minha, das saudades que eu tinha de cantar. 

E no ano passado, senti um chamamento muito forte e consegui conquistar o medo de ir atrás desse sonho, senti mesmo "é a hora, não vou adiar mais", e tudo, absolutamente tudo fluiu inesperadamente muito bem, sem esforço e muito mais rápido do que alguma vez imaginei. Quando estamos alinhados com o nosso propósito o Universo providencia tudo aquilo que a mente nos diz ser impossível, está sempre lá a tentar convencer de que não somos bons o suficiente, mas fi-lo por mim e estou muito feliz por ter conseguido transcender e ultrapassar o medo de me expor. Sim, porque quando cantamos é como se estivéssemos nus, transparece o nosso lado mais puro, a nossa alma fica impressa na vibração do som que atravessa o espaço. E fico comovida quando agora que tenho tido a oportunidade de cantar em ambientes com centenas de pessoas, e convido a quem me está a ouvir a cantar comigo, no final, algumas chegam ao pé de mim em lágrimas e sem conseguirem articular um palavra de tanta emoção apenas me dão um abraço forte e sentido. É muito gratificante através da voz poder ajudar quem me ouve a libertar emoções que tinham de sair. Cantar é tão terapêutico, como o senso comum diz: quem canta seus males espanta! E o canto devocional é isso, não é uma performance, não há afinados ou desafinados ... é um canto que vem de dentro do coração e que limpa a alma.



Tens de certeza um ou dois "Mestres" que te guiam, quem são e porquê?

Com todo o respeito aos “Mestres” que se têm atravessado na minha vida e que contribuíram largamente para aquilo que sou hoje, não consigo nomear nenhum em particular.

A minha grande Mestra é a Intuição, e procuro honrá-la sempre.
Deixo-me guiar acima de tudo pela minha intuição, e quem me conhece a um nível mais íntimo sabe que encaro toda e qualquer interação (mesmo que aparentemente insignificante) como sinais constantes que estão a ser transmitidos pelo Universo.

Procuro estar muito atenta a cada troca com o mundo externo e o impacto que tem no meu mundo interno, seja em que forma e expressão ela tomar ... às vezes tudo vem muito dissimulado e claro que a mente pelo meio distorce aquilo que a Fonte está a tentar transmitir.
Nada, absolutamente nada, é por acaso e se vem ter connosco é porque estamos preparados para receber esse sinal que estimula todo o nosso Ser na aprendizagem de uma progressão de compreensão do nosso propósito de Vida.



Se pudesse definir a paz mundial numa imagem, qual seria?

O símbolo do OM – o som primordial, o sopro vital, o som de vida. Ele equilibra o ser dando-lhe todo o seu poder estabelecendo a harmonia entre o corpo, a mente e o espírito.
Quando estamos integrados em harmonia, a Paz instala-se internamente no nosso microcosmos e vibramos a um nível energético que influencia tudo o que gira à nossa volta, o mundo, o macrocosmos.


✩ fim ✩